terça-feira, 28 de junho de 2011

Segundo ato

Para mim escrever era um ato de exorcismo.

Imprimir meus fantasmas em páginas tão brancas quanto seus véus fazia de mim um homem mais corajoso, mais convicto, melhor resolvido.

Porém, para minha surpresa, expor meus fantasmas de forma tão aberta na única tentativa de livrar-me deles teve um devastador efeito colateral que eu não havia lido nas letras miúdas da bula.

Minhas linhas, ou o efeito delas, trouxe-me o pior dos fantasmas. E para superar essa assombração não existe remédio.

Aconselharam-me os sábios que o tempo, em doses diárias, iria me curar.
Os românticos apontaram meu coração e afirmaram que eu deveria seguir seus desígnios sem questionamentos.
Poetas velhos amigos decretaram que sou afortunado por morrer de amor, exatamente como seus colegas em tempos medievais ao morrer de tuberculose esperando na chuva que suas impossíveis amadas abrissem as janelas de seus casarões e jogassem no gramado um lenço de seda embebecido do perfume de seus seios.

Meu veneno é esperar na chuva minha impossível amada, que nasceu das minhas linhas de exorcismo, tornou-se meu maior desígnio, minha insanidade mais presente, minha teimosia insistente, mas que jamais irá voltar.

Hoje, para mim, escrever é um ato de heroísmo.

2 comentários:

Glaucia disse...

Uma das piores sensações é sentir-se preso em um ponto da vida, em um dia, um momento...
Parece que o tempo passa e tudo sempre retorna ao ponto inicial onde tudo incrivelmente e malucamente passou á ser um conjunto de fatores surreais e desconexos, as vezes penso que permanecer nesse ponto sem encerrar de vez a questão é insanidade, outras vezes penso ser só uma forma de buscar uma solução e esgotar todas as possibilidades. Pode ser tb que seja uma forma de tortura pessoal, teimosia, enfim não interessa...
Só quem vive preso no tempo, sabe o sabor que ele tem e as suas oscilações entre a doçura de lembranças e o amargor de saber que elas são sim só lembranças.
Mas nada é mais amargo do que saber que não há solução e nada nem ninguém irá voltar.
Só resta saber se essa constatação é o sinal de que o período de prisão está acabando, ou é só o ponto de um ciclo vicioso que insiste em permanecer talvez eternamente...
Glau

Cris... disse...

Infelizmente, nada cura um coração apaixonado e que foi abandonado...

Lembra de mim?!

Beijo.